Carta aberta à população e ao poder público de São Paulo

Carta aberta à população e ao poder público de São Paulo

RE_OCUPAÇÃO MOINHO VIVO

No dia 22 de dezembro de 2011, a Favela do Moinho, a última do centro da cidade de São Paulo, sofreu uma tentativa de despejo forçado por conta de um incêndio criminoso que deixou pelo menos 580 famílias desabrigadas e, segundo relato dos moradores, ao menos 30 mortos. Diretamente relacionado a esse episódio está o fato de que a região – que está localizada no bairro Campos Elíseos, no centro de São Paulo – está entre as três mais valorizadas da capital. Segundo pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), entre novembro de 2008 e dezembro de 2011, o valor da área em que está a comunidade valorizou em 182,9%.
Em 30 de dezembro, apenas 8 dias após o incêndio, a prefeitura sob a gestão Kassab, obteve às pressas, a posse provisória de parte do terreno – justamente a parte atingida pelo incêndio, que compreende mais de um terço da área total da favela – com o intuito de demolir o antigo edifício Matarazzo, que ali ficava e que, segundo a prefeitura, apresentava risco de desabamento. Alegando questões de segurança, a prefeitura isolou esta área para realizar a demolição do prédio, primeiramente com tapumes de madeira, criando uma obstrução na transversal da favela, de ponta a ponta, trilho a trilho.
O edifício foi implodido no dia 1 de janeiro de 2012 e poucas semanas depois, os tapumes foram removidos e em seu lugar a prefeitura ergueu um muro de 8 metros de altura em concreto armado, que acabou por isolar completamente o espaço, impedindo-nos de reconstruir nossas casas, e deixando-nos também sem uma rota de fuga em caso de um novo incêndio.
Um novo incêndio de fato ocorreu, menos de 9 meses depois, em setembro de 2012, novamente em circunstâncias misteriosas, destruindo em torno de 90 barracos. Na mesma época, ocorria a campanha eleitoral pela prefeitura de São Paulo, e o então candidato Fernando Haddad visitou o local com a promessa de que se eleito, regularizaria e urbanizaria a área, afirmando que sua gestão não adotaria a política de afastar moradores de baixa renda do centro – o que sinalizava uma possibilidade de diálogo e de ruptura com a política higienista das duas gestões anteriores de Serra/Kassab, sempre alinhada aos interesses da especulação imobiliária.
No entanto, a medida que o tempo passa fica claro que a postura da gestão Haddad não se difere muito da gestão passada, e que a prioridade continua sendo atender aos interesses do capital imobiliário em detrimento das pessoas.
Desde dezembro de 2011 tentamos pelas vias legais reaver nosso terreno.
Há pelo menos 6 anos o terreno que compreende a favela está em disputa judicial entre o poder publico, uma empresa particular e nós moradores, que ocupamos o local há 25 anos. Em 2008, obtivemos uma tutela antecipada de usucapião coletiva, o que legalmente assegura nossa permanência no terreno até o julgamento final da ação que decidirá o destino da área.
Em março de 2013, o poder judiciário expediu uma liminar que obrigava a prefeitura a derrubar o muro e a construir uma rota de fuga. Assim como um laudo do corpo de bombeiros que data de dezembro de 2012, e que também recomenda a construção da rota de fuga, e de casas de alvenaria que ajudem a conter novos incêndios.
Diante deste cenário, em 30 de junho, os moradores e ex-moradores que perderam suas casas nos incêndios, se reuniram em assembleia e decidiram realizar o Primeiro Grande Ato em Prol da Favela do Moinho, para relembrar e cobrar as promessas de Haddad durante sua campanha.
No dia 12 de julho, fomos recebidos pelo prefeito em seu gabinete, que entre outras coisas, se comprometeu e estabeleceu um prazo para a demolição do muro e a construção da rota de fuga, porém o prazo não foi cumprido. Por essa razão, nós moradores, decidimos derrubar o muro com nossas próprias mãos e ferramentas. Ao longo da primeira semana de agosto, trabalhamos continuamente na derrubada do muro e, no domingo, dia 4 de agosto, durante o Segundo Grande Ato em Prol da Favela Moinho, fizemos uma abertura de 4 metros no muro. Na semana seguinte a prefeitura construiu, finalmente, a rota de fuga.
Com isso, nós da Favela do Moinho, exercendo e reafirmando nossa luta pela moradia à cidade decidimos re-ocupar e tomar de volta o terreno que nos foi expropriado. No dia 23 de agosto, 609 dias depois do primeiro grande incêndio, re-ocupamos o espaço, carpinamos o terreno, iniciamos a limpeza do entulho e das cinzas do prédio demolido e construímos o Barracão da Associação dos Moradores da Favela do Moinho.
Apesar de tanto descaso, de tantas dificuldades e atrocidades, no Moinho fizemos nossas vidas, construímos nossas famílias e nossa comunidade. Por isso, junt@s com vári@s outr@s apoiador@s, seguiremos firmes e irredutíveis na luta!

DO MOINHO NÃO SAIREMOS!
COMUNIDADE MOINHO LUTA!

Apoiam e Assinam:

Movimento Organizado Moinho Vivo
Associação de Moradores da Favela do Moinho
Movimento Hip Hop Organizado – Mh2o
Comboio
Peabiru
Escritório Modelo Puc-Sp
Ação Direta de Vídeo Popular
Movimento Mães de Maio
Movimento Passe Livre – Sp
Fanfarra do M.A.L.
Instituto Práxis Direitos Humanos
Rede Dois de Outubro
Passa Palavra
CMI – Centro de Mídia Independente – Sp
Mídia Negra
Rede Cultural de Solidariedade Autônoma (RECUSA)
Mutirão Cultural da Quebrada
Coletivo Zagaia
Cordão da Mentira
Rede Extremo Sul
Coletivo Gestor Sacolão das Artes
Sarau do Binho
Sarau da Vila Fundão
Sarau Perifatividade
Sarau Candeeiro
Luta Popular
Ocupação Esperança
Voz da Leste
Fórum Popular de Cultura da Zona Leste
Ocupacão Vento Leste
Kiwi – cia de teatro
Cia Estudo de Cena
Buraco d’Oráculo
Cia. São Jorge de Variedades
Centro de Trabalho Indigenista
Coletivo Dolores
Fábrica Ocupada Flaskô
Centro Cultural y Social El Birri Santa Fe Argentina